Era um final de tarde típico de inverno. Iria sair do trabalho e apanhar o metro até casa, puxaria o livro que tinha na mala e colocaria os phones nos ouvidos, a viagem iria demorar cerca de 20 minutos e sabia que quando chegasse à sua estação iria dizer para si mesma "Já?!"!
Entrou na estação de metro, olhou para o relógio na parede e esperou que o seu comboio chegasse. Olhou em volta reconheceu alguns colegas da empresa, de outros departamentos. Não os conhecia pessoalmente, mas já se tinham cruzado nos corredores. Reparou numa colega que estava constantemente a olhar para o relógio e para a linha na esperança que o comboio chegasse. Notava-se que estava stressada e muito nervosa, o telemóvel dela não parava de tocar e ela fazia de tudo para esquecer que tinha alguém que queria falar com ela.
O comboio chegou, e ambas entraram em carruagens diferentes. Pegou no seu livro, colocou uma música calma e deixou-se levar até casa.
Tal como tinha previsto a chegada foi rápida, arrumou o livro, e caminhou em passos largos. Queria chegar rápido a casa para puder tomar um merecido banho, e esquecer por algumas horas as preocupações laborais.
Enquanto fazia o caminho de todos os dias encontrou a tal colega que estava com ela no metro, decidiu aborda-la.
- Olá, sou a Gisela do departamento de Marketing...chamaste Maria, correcto ? vi que estavas nervosa no metro, está tudo bem? precisas de ajuda?
- Departamento de marketing? uhm nunca te vi...mas tá bem...
-É normal, sou nova na empresa...só fui contratada hà dois meses é natural que não me conheças!
-Olha estou com pressa, preciso ir...não tenho tempo para conversa fiada.
-Desculpa, só quis ajudar, parecias nervosa.
-E estou, mas nada que te diga respeito.
-Mais uma vez desculpa.
Gisela ficou furiosa, chateada consigo própria por não ter dito umas quantas verdades à colega, sentia-se uma autentica parvinha, por ter permitido uma fulanita qualquer armar-se em superior.
- Cambada de infelizes isso sim, descarregam nos outros os problemas da vida deles...ora esta, era o que mais faltava!
Rapidamente chegou a casa, descalçou os sapatos no Hall, pousou a mala e correu para o quarto para se despir.
Por muito que se esforçasse o episódio com Maria tinha-a deixado transtornada e incomodada. Já tinha percebido que o ambiente na empresa não era o melhor, mas nunca pensou que as pessoas fossem tão cruéis e mal educadas.
Na manhã seguinte, ao chegar ao trabalho passou pela cafetaria e cruzou-se com alguns colegas que tinham todos um ar de caso. Pareciam crianças da escola, a tentarem contar uns aos outros um segredo sem os outros em volta ouvirem. Aproximou-se do balcão e questionou a empregada do que havia de novo para estarem todos ali aquela hora.
- Parece que uma colega sofreu um acidente, segundo ouvi está com uma depressão profunda e a direcção não lhe autoriza a baixa dizendo que é fita dela.
Intrigada perguntou novamente se sabia de que departamento era, ao que a funcionaria lhe respondeu:
-A menina sabe quem é, é da informática, a Maria que é casada com o Engenheiro Menezes.
Por segundo, Gisela julgou estar a alucinar...não podia ser a Maria, mas ao mesmo tempo o comportamento dela no dia anterior estava justificado.
Conseguiu descobrir em que hospital estava internada, e fez questão de lhe enviar flores. Enviou um email ao marido e disponibilizou-se para o que fosse preciso, mesmo sem se conhecerem pessoalmente.
Quando regressou de almoço, a secretaria comunicou-lhe que estava um colega à espera dela na sua sala. Estranhou mas podia ser alguem da comunicação interna, a precisar de alguma ajuda.
- Olá, muito prazer...sou a Gis......o que é que estás aqui a fazer? - perguntou ela
- Eu sabia que eras tu...quando recebi o teu email esta manha.
- Mas eu não te enviei nenhum email, estás enganado...alias já não tenho o teu email...
-É claro que tens...hoje de manhã enviaste-me um email sobre a Maria...
- O que? tu és o engenheiro Menezes? Mas desde quando? de onde vem o Menezes? nunca te conheci com esse nome?
- Casei com a Maria e adoptei o nome dela...
-Não isto não me está a acontecer...tu trabalhas aqui? como é que nunca te vi...
- É normal que nunca me tenhas visto, eu não trabalho neste edifício, estou na sede e muito raramente venho até aqui...só em situações muito esporádicas...como hoje.
- Isto é inacreditável...depois de tudo o que se passou, encontrar-te na mesma empresa e cruzar-me com a tua esposa...é demais.
- Sim de facto é demais...
- Como está a Maria ?
- Não está bem, julgamos que ela tentou pôr fim à vida...apesar de ter sido atropelada tudo indica que ela se atirou para cima do carro. Isto já tinha acontecido anteriormente ela é muito frágil...
- ...pára pára...não quero saber...não quero mesmo saber. Só me interessa se ela está bem, o resto dos detalhes guarda-os para ti.
-Mas Gi porque é que me estás a tratar assim, friamente?
- Tens memória curta...mas eu não. Esquece que te enviei o email...e esquece que trabalhamos na mesma empresa. Sai da minha sala não preciso saber mais nada da tua vida.
-Mas eu gostava de saber da tua...
- Não me faças rir, quando eu precisei de ti viraste-me as costas e agora que estás casado, e tens um casamento problemático é que te interessas por mim. Esquece-me. Sai. Vai embora...vai!
Ele fez-lhe a vontade e saiu da sala. Ela voltou-se para a janela para ver se conseguia vê-lo a ir embora. Fechou a porta do escritório, e sem contar foi surpreendida com as lágrimas que há muito evitava.
Segundos após ele sair, recebeu uma sms dele. " Esquece o passado, eu era um miúdo parvo. Esse rancor só te faz mal. Se quiseres conversar procura-me estou disponível.".